segunda-feira, 26 de maio de 2008

Os Telhadistas.

OBS¹: HISTORIA MERAMENTE FICTICIA.
OBS²: 50ª POSTAGEM!

Todo mundo tem historias de traquinagens de infância. Nas minhas inúmeras, minha mãe conta – e eu me lembro - de que eu gostava de subir no telhado para ler. É ai que a memória da minha mãe acaba e entra em tona a minha. Existe uma grande verdade oculta acerca desse hábito, inicialmente infantil, de simplesmente ler algo no telhado. Coisas intrigantes e inacreditáveis aconteciam – e ainda acontecem - acima das casas das pessoas, sem que ninguém jamais note, principalmente à noite.

A noite é um subterfúgio incrível para quem não quer ser notado. Os vampiros, os Maçons, os Satanistas, eram grandes adoradores da noite. Não pelo seu aspecto mórbido, vale ressaltar, mas pela furtividade que a noite propicia. Até por que, sem entrar no mérito de defesa, com um tantinho de pesquisa, descobre-se que esses seres jamais foram adoradores do mal. Os vampiros, os Maçons e os Satanistas nada mais eram – ou são - do que membros de sociedades secretas.

O que são sociedades secretas? São conjuntos de pessoas que participam de um ideal – sendo este introduzido por diversas portas – que sabem do impacto de suas idéias e decidem, portanto, não divulgá-las para aqueles que desconhecem suas razões. Todo mundo sabe da existência da Maçonaria, mas ninguém não pertencente ao meio sabe do teor dos acontecimentos nas entranhas de suas reuniões. Dizem que estes são os que mais prezam por seus segredos atualmente. Pobres ignorantes desconhecem a maior sociedade secreta de todos os tempos, os: Telhadistas.

Meu conhecimento sobre os Telhadistas começou quando eu, ainda novo, iniciei esse habito de ler no telhado, como conta a minha mãe. Todos os dias, no mesmo horário, eu subia no alto da casa e passava horas apenas lendo. Era meu pequeno refúgio. Sempre que alguma coisa apertava pra mim, eu subia e ficava horas apenas esquecendo tudo. Enquanto eu era pequenino, isso não configurava nada demais. Eu geralmente não sabia de acontecimentos fortes e, quando sabia, eram difíceis às vezes em que eu entendia o que estava acontecendo. Algumas vezes, porém, o entendimento perpassa pelo nível intelectual e invade o sentimental. E em algum momento, em meados dos anos 90, minha moradia estava em crise. Eu não sabia o que era, mas eu sentia isso. E cada vez mais, o telhado era meu esconderijo.

Comecei a fugir do quarto, pela janela, quando todos na casa já dormiam. Nessas fugas, meu destino era óbvio. Uma noite daquelas, porém, enquanto eu subia para o meu lugar de sempre, eu observei uma movimentação estranha na casa da vizinha. “Ladrões”, pensei. E fiquei escondido, deitado e apenas observando o que aquele grupo fazia ali, reunido. Comecei a constatar que se tratavam de mais de dez pessoas. Eles conversavam em códigos quase mudos, com pequenas palavras balbuciadas e muitos toques e abraços. Percebi que a cada minuto mais um grupo de pessoas chegava. Repentinamente, eu vi que um deles, que me parecia ser seu líder, fez uma pequena contagem e um sinal de “sigam-me”. Minha curiosidade infantil não deixou com que eu ficasse quieto e eu fui seguindo eles de longe ate que o medo se tornasse maior que tudo. Eles faziam movimentos dificílimos com extrema maestria, passavam facilmente de um telhado para o outro enquanto eu ainda era deficiente nessa ciência. Consegui ver, entretanto, o destino que eles desejavam: um casarão imenso com uns quatro andares, longe da minha casa. Mas eles tinham atalhos incríveis que fizeram com que chegássemos extremamente rápido ao local.

Voltei para casa e, nas semanas seguintes, eu ficava no mesmo horário, e no mesmo local esperando para ver se eles apareceriam novamente. Não falei sobre o assunto a ninguém, pois sabia que todos, tementes a perda de sua paz em casa, perseguissem os Telhadistas. Mas eles não apareciam mais. Ao invés de me esquecer do acontecido, porém, esse fato era um catalisador da minha curiosidade. Passei dias andando pelos telhados da vizinhança, traçando pequenos mapas mentais que fizessem com que eu conseguisse um rastreamento da localidade. Um dia desses de rastreamento, à noite, eu consegui traçar um caminho alternativo para o casarão. Quando cheguei, percebi que aquela casa era abandonada há tempos, e que uma grande festa acontecia no isolamento daquele telhado imenso. Fiquei um bom tempo apenas olhando à distancia, quando percebi uma movimentação pelo caminho que fiz com aquelas outras pessoas noutro dia. Em um acesso de coragem, eu cheguei cada vez mais perto, quando vi que eles distribuíam algo entre si. Eram quilos de alimentos não perecíveis, que garantiam sua permanência entre os Telhadistas, como depois pude constatar.

O que acontece era o seguinte. Esta era uma sociedade muito mais organizada do que eu podia perceber. Eles tinham um líder, o Grão-supremo. Esse Grão-supremo distribuía sua liderança em cinco grupos: Os alimentadores, os vestidores, os soldados e os responsáveis pela água e abrigo. O centro de reunião deles era o velho casarão abandonado, onde eles trocavam o que conseguiam. Os únicos que raramente apareciam nas imensas reuniões eram os soldados, que ficavam de prontidão para relatar a proximidade da polícia ou de ladrões, por exemplo.
Caso algum dos grupos não cumprisse com suas responsabilidades, era feito um julgamento no qual pude perceber o zelo dos Telhadistas por seu segredo. Até então, de todos os julgamentos, eu não pude ver nenhum, pois o local onde eram realizados eram extremamente bem patrulhados pelos Soldados. E foi numa tentativa de descobrir como se fazia o tal julgamento que eu fui capturado por um dos soldados do Grão-supremo. Foi justamente ai que começou o meu envolvimento com os Telhadistas.

Fui levado de encontro ao Grão-supremo, que me fez inúmeras perguntas. Depois de horas respondendo-o, já completamente amedrontado e nervoso, este se levanta e vem em minha direção. “É agora”, pensei. “Ele vai me matar e ninguém vai saber de nada.”. Ele ordenou que todos descessem do telhado e voltassem ao seu posto de patrulha. Foi quando eu fui iniciado. O Grão-supremo me levou ao encontro dos seus Sacerdotes, os líderes dos alimentadores, dos vestidores, e dos responsáveis por água e abrigo. Estavam todos de preto, em silêncio. Fui questionado por eles novamente, que me pediram que esperassem. Uma pequena reunião se formou e então eles começaram a me introduzir na ‘lei do silêncio’, no ‘sistema de códigos’ e no ‘segredo absoluto’. Mostraram-me que aquela era uma sociedade totalmente anticapitalista, com essas leis fundamentadas e que eu iniciaria meu trabalho como Soldado, caso quisesse entrar pra sociedade. De prontidão aceitei. Em pouquíssimo tempo, eu descobri que não eram apenas de Soldados que se faziam os patrulhadores. Eles tinham patentes tão altas e tão respeitáveis quanto o do exército convencional. E, em pouco tempo, eu ganhei a confiança do Grão-supremo, inclusive denunciando soldados, capitães e generais por corrupção. Acontece que eles estavam vendendo algumas informações a ladrões que buscavam furtar o acervo de alimento, roupas dentre outras coisas dos Telhadistas. Descobri a fraude e delatei ao chefe. Dois generais e seis soldados foram mortos naquela semana.

Foi quando eu decidi que não seguiria a linha dos Telhadistas. A culpa pela morte dos corruptos me fez não subir ao telhado pelos dias seguintes, pelos meses seguintes, e por alguns anos seguintes. Nunca mais eu tive acesso nenhum a aquela sociedade tão bem fundamentada, mas tão facilmente fragilizada, pois sabia que esta estava fadada ao fim.
Poucos meses depois um bilhete cai na janela do meu quarto. O Grão-supremo estava morto, alguns generais corruptos assumiram o poder, e queriam a minha cabeça, e uma guerra se instalou nos telhados da cidade. Silenciosa, mas sanguinária e cruel. Até que eu, assim como os princípios da sociedade, fomos esquecidos pelos assassinos e pelos mortos. E a minha vida continuou, no chão.

2 comentários:

Michell Almeida disse...

É mesmo, filho?
Estória interessante..

Pedreira disse...

Muito interessante. =]